domingo, 20 de maio de 2007

Papa veio orientar e pedir para não conformar com propostas do mundo, diz Dom Vitório

Gilmar Hernandes

A visita do Papa Bento 16 no Brasil, de 9 a 13 de maio, foi no intuito de nos orientar e ainda para que os fiéis não se conforme com as propostas fáceis oferecidas pelo mundo, conforme disse o arcebispo católico de Campo Grande, Dom Vitório Pavanello, em entrevista exclusiva ao Midiamax.

Em sua primeira entrevista, após a visita do Papa, Pavanello destacou que o pontífice abriu ainda a V Conferência Episcopal do Brasil e do Caribe apresentando uma proposta de reflexão, para que todos tenham vida. Pavanello reforçou ainda que a Igreja não pode abrir mão dos princípios, pois nunca vai aceitar o aborto, o divórcio, a eutanásia, casamento homossexual, entre outros.

Dom Vitório acrescentou ainda que a Igreja, assim como o Papa Bento 16, não estão preocupados com a quantidade de católicos, mas sim com a qualidade de fé e vida cristã desses fiéis. Uma das maiores preocupações do arcebispo e do Papa é aquelas pessoas que abandonam a Igreja e não encontram outras religiões, ficando ao Deus-Dará.

Ele acrescenta ainda que o importante não é ter santos, mas que as pessoas possam seguir os caminhos de Cristo, como fez Frei Galvão, que foi canonizado o primeiro Santo brasileiro no dia 11 de maio.

Para Dom Vitório, Joseph Ratzinger, o Papa Bento 16, é uma pessoa muito humana, simples, atenciosa e de fácil compreensão ao compará-lo com o antecessor João Paulo II. Ele observa que cada um tem um brilho especial, mas que os dois transmitem a beleza, o encanto e o amor de Deus.

O que significou a visita do Papa Bento 16 para os católicos e para o Brasil?Para o Brasil e a comunidade da Igreja Católica a visita do Papa significou, em primeiro lugar na perspectiva da fé, uma grande benção de Deus, pois a gente vê o Papa como um chefe de Estado, pois o Vaticano é independente, sendo o menor, mas que tem a maior força moral do mundo. Segundo lugar, ele é um grande teólogo e uma pessoa muito experiente com as situações delicadas e divergentes de correntes dentro da Igreja Católica. Ele representa o sucessor de Pedro, por mais que possamos contempla-lo como chefe de Estado, como grande teólogo, ele vem revestido e não pode despojar de confirmar os irmãos na fé. Também sempre com uma palavra muito valiosa para todas as pessoas de boa vontade, porque a igreja é uma instituição, mas um povo muito aberto a todas as situações que existem no mundo e para todos quer ser um sinal de um Deus que ama e o povo que existe sobre a Terra.

Essa aproximação da maior autoridade da igreja católica com o povo brasileiro, o que muda?
Não sei dizer o que vai mudar, pois o Papa veio com o objetivo primeiro de abrir uma importante reunião de Bispos de toda a América Latina e também do Caribe com representantes dos bispos de cada País. Uma conferência onde não estão todos os bispos, mas com representantes de cada País, sendo que o Brasil estará com mais ou menos 30 bispos, representando os mais de 400 bispos. Essa conferência vai refletir sobre importantes problemas que desafiam a igreja no nosso continente e diante deles não podemos ficar indiferentes, temos que ponderar e ver que estratégias podemos tomar para a igreja continuar ser o sinal do amor de Deus, sinal da verdade e a força da união de todos. Esses são os objetivos pelo qual o Papa veio e deu propostas e pistas para que possamos desenvolver e caminhar nestas diretrizes.

Qual a mensagem do Papa?O Papa mesmo apresentou para nós uma proposta de reflexão discípulos e missionários de Cristo, para que todos possam ter a vida. Ele que é o caminho, a verdade e a vida. Então, primeira coisa, diante daquilo que a mídia fala da perda de fiéis da igreja, deve-se em primeiro lugar ter que convidar a todos a entrar na escola, no discipulado de Jesus Cristo. A escola que Cristo propõe para mim, pra você e pra todos é uma escola onde devemos entrar no âmago nas questões da sociedade, porém nunca com a força, com a violência, nem ódio, concorrência, mas apresentar um Deus que por natureza tem paciência e humildade. Na humildade a gente reconhece as nossas situações de pecado, pois se não conseguimos atrair todos ao barco da igreja é porque não sabemos refletir a infinita beleza de Deus, que também na sua maneira de ser conosco, também é humilde, sabe esperar, compreender, sabe suportar as injurias e nunca deixa de servir. Temos que entrar na escola linda do evangelho e levar a experiência desse encontro com Deus para os outros. Quando a gente está cheio de Deus, a gente nunca se intimida.

Quais os pontos principais que o Papa acabou levantando para a Conferência do Episcopado da América Latina e do Caribe?Primeiramente, pode se dizer que o Papa e a igreja, não podem abrir mão de pontos fundamentais, pois se abrir não é mais depositária das da confiança de Deus. O papa veio nos orientar e como diz São Paulo, nós não podemos nos conformar com as propostas do mundo, proposta de morte. A cultura social de hoje da nossa sociedade é uma cultura de morte, onde no pretexto de cada um querer sobreviver e alcançar seus meios, vida e realização acaba matando os outros. Então, a Igreja não pode abrir mão da dignidade do homem, que tem de ser respeitado, dignidade da vida. Hoje, por exemplo, há uma proposta de aborto e não podemos admitir o aborto. O ser humano uma vez que ele existe é um ser sagrado, constituído por corpo e alma. Você existe desde o primeiro momento da concepção e não pode abreviar a vida e nem facilitar modos você possa abreviar sua vida. A sociedade que se materializa, que se afasta dos princípios de Deus, não querendo colocar os valores propostos por Deus, lógico não vai querer uma gravidez que possa incomodar ou mesmo um velho doente. Temos que ajudar o homem a não sofrer e viver com dignidade, onde os pobres sejam menos pobres e os ricos menos ricos, mas que todos sejam felizes. A igreja não abre mão disso. Hoje, li um artigo que a igreja é quadrada, atrasada e retrógrada, porém a igreja não abre mão, pode chamá-la, ela vai sempre condenar o aborto, nunca vai aceitar o divórcio, a eutanásia, a escravidão humana, que as pessoas sejam manipuladas, a prostituição, casamento de homossexuais, porque não é do projeto humano, pois o homem é homem para assumir uma mulher e vice-versa e não mulher com mulher e nem homem com homem.

O Papa Bento 16 criticou a mídia por supostamente menosprezar a instituição do casamento e fazer pouco dos apelos pela virgindade dos solteiros. Está havendo uma banalização do que vem a ser família?
Temos que reconhecer que há meio de comunicação social que está envolvida com interesses econômicos, então pouco se interessa pelo bem da família enquanto unidade, pró-criativa, enquanto sinal de harmonia, interessa que a família seja produto de consumo, então essa mídia conflita com os princípios fundamentais do ser humano. Uma das grandes realizações do homem é viver e fazer o bem, sozinho e também em comunhão com outros. Um dos grandes anseios que o ser humano tem é o casamento, que vai assumir uma parceria de vida com o sexo oposto e que no amor haja vida. A igreja denuncia que não pode ter a família egoísta, com um ou dois filhos. A igreja vai sempre conflitar com as propostas egoístas da mídia. Nesse aspecto que o Papa criticou a mídia por não estar olhando o bem comum e sim o bem particular.

A visita do Papa teve ainda um gostinho a mais com a canonização do primeiro santo brasileiro, o Frei Galvão. Qual a importância para a igreja em ter um santo brasileiro? Como quem sempre canoniza é o Papa e o Freio Galvão estava na eminência de ser canonizado, coincidiu de ele estando aqui canonizar. A mídia salientou a importância do primeiro santo brasileiro do Brasil, mas o importante não é termos santos canonizados e sim o que a Igreja do Brasil seja Santa. E quando ela é uma igreja santa? Quando ela partir do evangelho de Cristo sente-se forte e abrace os pobres, não para deixa-los na pobreza, mas para ajuda-los a buscar uma justa dignidade. O santo verdadeiro fez o que fez Frei Galvão em vida, homem que andava léguas e léguas a pé para servir os que estavam doentes. Ele era até de uma família de bem estar, mas despojou-se pra abraçar uma vida de pobreza e servir a todos. Ele não se limitou. O santo é aquele que se apaixona por Deus e como Deus é um homem que se volta para o homem, então ele se volta em nome de Deus para ajudar os outros. Se a gente puder viver as virtudes que eles cultivaram, chegaremos lá também.

Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 1991, os católicos somavam 83,8% dos brasileiros e, em 2000, o número caiu para 73,8%. Esses índices refletem a realidade do Estado hoje e a vinda do Papa pode modificar esse estudo, vai aumentar o número de fiéis?Primeiro o que estamos ouvindo de 2000 para cá é que houve um estancamento da saída de católicos da Igreja, não está mais diminuindo o número de católicos. Não me preocupo muito com a saída, mas me preocupa, aliás o que também o Papa falou, não publicamente, mas de uma forma reservada, de que está mais preocupado com a qualidade de fé e vida cristã do que com número. De que adianta ter um grande número de católicos, mas que se pegar e colocar dentro de um saco e levar para o rio Paraguai para as piranhas comer, certamente perderá o saco, porque de qualidade não existe nada. Qual o número que faz a Igreja? Quem faz a igreja é a autenticidade de vida que o cristão deve levar e o cristão ele tal assim quando abraça realmente a causa do reino de Cristo. E quem quer ser meu discípulo e entrar na minha escola [Cristo], tome a sua cruz e me siga.

Qual a proposta do cristianismo?A proposta do cristianismo é uma proposta árdua, se você quer ser autentico você tem que renunciar. O mundo hoje promete e facilita tudo por você, mas essa não é a cruz que Deus lhe pede. Deus não lhe promete facilidade, e pede que abrace cruz de renúncia, se você é solteiro não tem liberdade para praticar o sexo, pois é sexo bem belíssima na vida matrimonial, pois fora dele é uma agressão à própria dignidade, porque um ou outro está sendo manipulado. A igreja pede para você tenha relações profundas de amizades com Deus através da oração, na participação dos atos de comunidade. Sentimos que muitos abandonam a igreja, mas o que nos mais preocupam são aqueles que se decepcionam totalmente e vivem um indiferentismo de religião e que às vezes saem da Igreja e não encontram em outras religiões e ficam ao deus-dará. Esses são os mais prejudicados na vida, pois sem Deus ninguém é feliz.

Dentro dessa proposta de estar melhorando a qualidade dos fiéis, a igreja tem um projeto para trabalhar?A Igreja nesta V Conferência está propondo que na escola de Jesus Cristo, o missionário leve essa proposta de uma verdadeira liberdade, lógico que não significa que o cristão viva só fazendo penitência. Há um lindo documento antigo, de um homem comum que está na sociedade e ele não se diferencia dos outros, fala a língua dos que estão na sua cidade, se veste igual aos outros, tem os mesmos costumes, porém ele é diferente, difere nos bons costumes, sabe compreender, ser solitário, sendo que eles eram bons, mas porque eram perseguidos? Porque a mídia bate em cima da Igreja? Porque ela é diferente, tem propostas diferentes. Pois a Igreja, na coerência com seu fundador, ela não pode pactuar com a corrupção, com a opressão, com a injustiça. O Papa pede uma boa evangelização, que é anunciar as riquezas Deus através de Jesus Cristo revelada através do Evangelho.

Qual a comparação que o senhor faz do Papa João Paulo II e do Papa Bento 16? Todas as estrelas no céu têm o brilho. João Paulo II têm um brilho grande, até porque teve um longo pontificado, tem um jeito de se relacionar, era um grande artista de teatro, sabia como se apresentar às massas. E esse Papa [Bento 16] tem outro tem outro brilho, mas da teologia, forma simples, ele é mais fácil de ser entendido do que o João Paulo II. Bento 16 é humano, simples, muito atencioso e cada um tem o seu jeito. Temos padres muito bons, mas não são fogueteiros, outros mais tímidos, mas muito amado pelo povo. Toda estrela tem seu brilho, mas nem todo brilho é igual ao outro. Podemos dizer que o Papa Bento 16 tem um outro brilho, sendo que a beleza da mensagem dele é reluzente. Lá em Roma dizem que antigamente o povo ia para ver o Papa João Paulo II e hoje até vai mais gente para escutar o Papa Bento 16. Cada um tem o seu jeito, mas todos transmitem a beleza, o encanto, o amor de Deus nosso Senhor. Certamente a visita do Papa vai repercutir muito não só em um fluxo imediato, porque estava todo mundo fascinado por ele, mas agora vamos começar a pensar, mudar e encontrando a humildade da graça e vamos colher muitos e belos frutos. Muita gente até já se converteu graças ao jeito do Papa, muito humano e muito simples. Acho que o Brasil mudou muito na sua concepção quanto o Papa, mas o Papa mudou também com relação à concepção a nós brasileiros. Ele mesmo chegou bastante comedido, diplomata na relação com o presidente [Lula], depois foi se soltando aos clamores do povo. No estádio do Pacaembu já era um abraço bem brasileiro. Tenho a impressão que o Papa voltou um pouco mais brasileiro.